O ser humano, em suas relações com os demais indivíduos, desfruta de
vários direitos que lhe garantem a defesa de valores básicos,
reconhecidos por sua própria condição de pessoa humana tomada em si
mesma (direitos individuais) e em suas projeções na sociedade (direitos
sociais). São estes, os direitos da personalidade.
Admitem-se neste caminho direitos físicos, psíquicos e morais, que
por sua vez protegem, respectivamente, os aspectos externos e internos
da personalidade humana e sua projeção na sociedade, sob os aspectos
individuais e sociais. São direitos reconhecidos em defesa de valores
inatos ao homem, como a vida, a liberdade, a integridade física, a
honra, a intimidade, entre outros.
Embora hodiernamente consagrados pela lei, doutrina e jurisprudência,
seu progresso foi conquistado a duras penas, inçado por dificuldades de
caráter ideológico, chegando determinados autores a negar-lhes mesmo a
existência, com base na ideia de que, havendo direitos do homem sobre a
própria pessoa, justificar-se-ia o suicídio.
Rubens Limongi França (1999, p. 936) critica o “extremismo em que
descambam”, pois esta afirmação importa em “fazer tábua rasa da própria
finalidade do Direito” que existe para permitir à pessoa “seja
aquinhoada segundo a justiça com os bens necessários à consecução dos
seus fins naturais. Ora, o extermínio da vida pelo suicídio é a própria
negação disso, é a coarctação da causa final do Direito.”
Sua própria denominação é também polêmica. A expressão bens essenciais da personalidade é defendida e utilizada pelos doutrinadores jurídicos, às vezes, precariamente, mas reconhecendo, na sua maioria, a expressão direitos da personalidade, em nível nacional[1] e internacional[2]. O Código Civil espanhol somente alude a esta denominação no art. 162[3],
reformado pela Lei de 13 de maio de 1981. É a partir da Lei nº 1 de 5
de maio de 1982, a qual dedicará uma detalhada explicação
posteriormente, donde se alude expressamente em seu preâmbulo aos
“direitos da personalidade”.
No Brasil, a relevância dos direitos da personalidade alcança tamanho
grau que os levam à proteção constitucional, como se pode constatar no
art. 5oda Constituição da República Federativa brasileira de 1988:
Art. 5o[...]
III. ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
IV. é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
VI. é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo
assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma
da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias;
X. são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem
das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação;
XII. é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão,
atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;
XV. é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz,
podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou
dele sair com seus bens;
XVI. é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;
XLIX. é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;
LIV. ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
LXV. a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária [...]
Além disto, a questão fustiga a polêmica em torno dos artigos constantes do Capítulo I: Da Personalidade e da Capacidade, acoplado ao Título I: Das Pessoas Naturais, do Livro I: Das Pessoas,
do Novo Código Civil brasileiro. O art. 2º do Código Civil, ao anunciar
que a personalidade, a pessoa, começa com o nascimento com vida,
assegura os direitos do nascituro desde a concepção. Entretanto,
conforme a elaboração doutrinal e jurisprudencial posterior, foi-se
acentuando a ideia do reconhecimento e proteção de certos atributos jurídicos inerentes ao homem, chamados direitos da personalidade em sentido estrito, próprios à pessoa natural, com extensão aos nascituros.[4]
[1]
Veja-se, por todos: DINIZ, 2002, v. 1, p. 117-136; GOMES, 2000, p.
141-164; MONTEIRO, 2003, v. 1, p. 96-99; RODRIGUES, 2002, v. 1, p.
61-75; PEREIRA, 2000, v. I, p. 141-160.
[2] Veja-se, por todos: DE CUPIS, 1961. 337 p.;BORDA, 1976, p. 175-178; LACRUZ BERDEJO, 2000, v. 2, p. 35-36.
[3]
O art. 162 do Código Civil espanhol, no que se refere ao tema em
discussão, dispõe: “Los padres que ostenten la patria potestad tienen la
representación legal de sus hijos menores no emancipados. Se exceptúan:
1º. Los actos relativos a derechos de la personalidad u otros que el
hijo, de acuerdo con las Leyes y con sus condiciones de madurez, pueda
realizar por sí mismo”.
[4]
O juiz do Segundo Tribunal de Alçada Cível de São Paulo, Euclides de
Oliveira estende ao nascituro a aplicação dos direitos da personalidade
(OLIVEIRA, 1998, p. 30-31). Também: ALMEIDA, 1983. 370 p.
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